Prof.ª Dr.ª Erika Ciconelli De Figueiredo
Profissionais que trabalham em escritórios passam grande parte de seu tempo em ambientes fechados, o que reduz significativamente sua exposição à luz natural ao longo de suas carreiras. Essa situação resulta em uma maior dependência da iluminação artificial, especialmente durante o período noturno. A exposição à luz, em particular à luz natural, é o principal fator regulador dos ritmos circadianos, desempenhando um papel crucial na manutenção da saúde e do bem-estar.
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O padrão de estilo de vida moderno leva a uma perturbação no ritmo circadiano das pessoas, resultando em diversas doenças. O ritmo circadiano, também conhecido como relógio biológico, é o mecanismo que regula o organismo de acordo com o ciclo do dia e da noite. Este ritmo é responsável por sincronizar as funções fisiológicas do corpo com o período de 24 horas.
As consequências da pouca exposição à luz do dia a curto prazo são: irritabilidade, problemas de concentração, falta de motivação e comprometimento da memória. As consequências a longo prazo são: o estresse fisiológico e psicossocial, as doenças cardiovasculares, o aumento do uso de estimulantes e sedativos e a síndrome metabólica.
De acordo com diversos estudos, a perturbação circadiana é identificada como um dos fatores associados ao aumento do índice de massa corporal e à obesidade, juntamente com o tabagismo, a dieta, a fadiga e a qualidade do sono. A exposição insuficiente à luz natural durante o dia, combinada com a exposição excessiva à luz artificial durante a noite, tem levado a uma desconexão entre os indivíduos e o seu ambiente circundante, contribuindo para os problemas mencionados anteriormente.
Edifícios de escritórios com envoltória de pele de vidro têm um impacto significativo no bem-estar e na saúde dos ocupantes. De acordo com os arquitetos que especificam essa solução, sua principal vantagem é a conexão visual entre o interior do edifício e o ambiente externo. No entanto, as altas iluminâncias nas proximidades das fachadas internas, bem como a incidência de luz solar direta, frequentemente leva ao fechamento das persianas.
Estudos indicam que esse é um cenário recorrente em edifícios com peles de vidro, onde as persianas permanecem fechadas e a iluminação artificial ligada. Além disso, por motivos de conveniência, essas persianas podem permanecer abaixadas por longos períodos, variando de dias a até meses ou anos.
As pesquisas intituladas “Saúde e bem-estar: impactos da iluminação natural e elétrica no ritmo circadiano” e “Fachadas envidraçadas: proposta de envoltória para aumentar o desempenho da luz natural, reduzir o ofuscamento e promover o ritmo circadiano regular dos ocupantes”, cuja líder é a Prof.ª Dr.ª Erika Ciconelli de Figueiredo, desenvolvidas na Universidade Presbiteriana Mackenzie, apontam para alguns resultados:
As simulações computacionais com vidros de transmissão luminosa de 32% demonstraram que a faixa que mais favorece a manutenção do ritmo circadiano regular fica a, no máximo, 9m da fachada, sendo que é necessário que as estações de trabalho estejam voltadas para a envoltória.
Para aproveitar a luz natural em uma profundidade de até 9 metros da fachada, é necessário utilizar não apenas vidros seletivos, mas dispositivos de controle solar na envoltória, que reduzem o ofuscamento e eliminam a necessidade de persianas internas. Nesse caso seria possível utilizar vidros seletivos com uma transmissão luminosa mais alta.
O ritmo circadiano é regulado pela quantidade de luz que incide sobre a retina, ou seja, no plano vertical. Estações de trabalho orientadas em direção às fachadas ajudam a manter um ritmo circadiano regular nos ocupantes, promovendo a saúde, o bem-estar e melhorando o desempenho das atividades laborais.
O acesso visual ao exterior é essencial não somente para regular o ritmo circadiano, mas para contribuir com o relaxamento dos músculos oculares. Fazer pausas ao longo do dia e direcionar o olhar para o horizonte permite o relaxamento dos músculos ciliares.
O projeto das fachadas pode considerar outras soluções que melhoram o desempenho da luz natural e prolongam o seu alcance, como prateleiras de luz.
O segundo maior gasto de energia de um edifício é a iluminação artificial. Se as fachadas forem projetadas para melhorarem o desempenho da luz natural é possível que se reduza o consumo de energia.
A solução para este problema não é simples, mas é importante que os arquitetos considerem incorporar nos projetos os estudos e soluções para iluminação natural em edifícios. Há a necessidade de uma mudança cultural, onde as questões de bem-estar dos usuários se equiparam às de consumo de energia.
Prof.ª Dr.ª Erika Ciconelli De Figueiredo é docente da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM)
*O conteúdo dos artigos assinados não representa necessariamente a opinião do Mackenzie.
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